
Enter Sandman
Ele via o rosto dela em todos os
lugares: no trânsito, no escritório, no elevador, nas festas, nos sonhos. Aquilo
deixava os nervos dele em frangalhos, pobrezinho. Às vezes ele até atravessava
a rua quando via alguém parecida com ela – mas, assim que desse, virava para
trás na esperança de encontra-la o olhando de volta. Aqueles olhos cor de
areia.
Areia movediça.
Com o tempo, ele parou de se
abalar e começou a ficar furioso. Dane-se
ela, dane-se tudo que lembra ela, dane-se essa minha vidinha de merda, dane-se,
dane-se, dane-se dane-se dane-se
A próxima coisa que ele sabia é
que estava sentado em uma mesa de almoço com a família em um desses domingos
ensolarados, perfeitos para fazer uma macarronada ao molho de discussão
familiar.
Ele se levantou da mesa. Ergueu
seu copo cheio de refrigerante em uma mão e bateu gentilmente nele com um
talher aleatório, chamando a atenção de todos. Seus parentes
voltaram-se para ele, exasperados, rezando internamente pra que ele não
trouxesse à tona o aquele assunto. Ela.
- Estou me mudando para o Alasca.
– ele anunciou quando todos estavam
prestando atenção nele.
Alguns segundos se passaram e
nada. Sua mãe, finalmente, soltou uma risada alta e incrédula, típica de gente
desesperada.
- Que é isso, menino? Come logo
esse macarrão e não tenta fazer piada mais não!
Ele sentou-se, vitorioso. Aos poucos
a mesa voltou ao normal, mas a sua vida nunca mais seria a mesma. Ele estava
decidido. Nada disso de vê-la no meio da multidão. Nada disso de ouvir a voz
dela. Ele já tinha a solução perfeita.
Dias e dias depois, lá estava ele
no Alasca. Deixou uma mãe chorosa, um pai indignado e uma família com um
assunto para discutir pelos próximos cinquenta domingos ensolarados. Fez um
iglu sozinho. Não queria nenhum contato humano. Vestiu-se com vários casacos,
guardou peixe para consumir durante uma semana inteira e, finalmente, entrou na
sua nova casa e encarou a parede.
Tudo tão nu, tão branco e tão
brilhante. Tudo tão nada. O frio ia consumindo aos poucos suas camadas de roupa,
mas ah, nada que ele não soubesse lidar. Era bem melhor aquilo do que ser
tragado por aquela areia que o perseguia até durante o sono.
E o silêncio? Nenhum murmúrio,
nenhum som – nem o do vento soprando. Nada para ser confundido com alguma
espécie de voz humana. Ele quis suspirar, mas se conteve. Não queria confundir
seus sentidos que já estavam acostumados a associar qualquer coisa a ela.
Até que, depois de minutos de
silêncio, ele notou um som que sempre esteve ali, mas que lhe passava despercebido. Sua audição, agora aguçada, só conseguia ouvir BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM – aquilo tudo preenchia seus
ouvidos, tudo martelava, tudo tremia, todas as paredes que ele construiu na
própria mente caíram aos pedaços e se desfaziam feito pó. Feito areia.
Congelado de frio de pânico,
tentou buscar a origem daquele som. Olhou em volta. Olhou rapidamente o lado de
fora. Revistou suas próprias roupas e, quando colocou a mão no zíper do
primeiro casaco, ele notou.
BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM
BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM
BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM
BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM
BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM BOOM
Ele finalmente suspirou,
derrotado. Fora tão ingênuo na sua intensa vontade de se isolar de tudo que
conhecia que o lembrava dela que acabou se esquecendo do principal causador de
toda aquela droga. Foi preciso ele estar completamente isolado para ouvir
aquele bastardo.
Abriu o casaco e levou a mão ao
peito.
Seu coração ainda batia.
.
.
.
.
.
merda!
Puta merda, izzle! Que conto lindo. Que isso, muito fofo!
ResponderExcluircaraio, MUITO FODA! pensei que, por algum acaso, ele ia encontrar a dona dos olhos cor de areia no Alasca LOL
ResponderExcluirApaixonante.
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